A perseguição ideológica ao pensamento crítico tem se dado em diferentes lugares e contextos, a exemplo do que tem acontecido no Brasil em relação às ideias de Paulo Freire. E, não por acaso, a perseguição política ao legado de Freire se dá em um contexto bastante adverso vivido na América Latina, marcado pelo aprofundamento das desigualdades sociais e dos processos históricos de opressão.
No âmbito de mais uma crise estrutural do capitalismo, está em curso uma forte ofensiva do capital contra o trabalho, com a retirada de direitos trabalhistas e sociais, rebaixamento do nível de vida das trabalhadoras e dos trabalhadores, aumento da exploração e implementação de contrarreformas neoliberais, que procuram transformar os serviços públicos em negócios e mercadorias. Constata-se ainda uma ofensiva do governo dos Estados Unidos contra os governos progressistas na América Latina, com o apoio a golpes de estado pela via parlamentar, midiática e judiciária.
Soma-se a isso tudo uma forte ofensiva ideológica das classes dominantes que procuram desconstruir, mistificar e atacar o pensamento crítico, impondo uma visão conservadora, reacionária e fundamentalista de mundo, que reforça as opressões a que historicamente estão submetidas as classes subalternas nos países do Sul global. Entendemos que o pensamento crítico precisa ser visto no plural, mas as ideias de Paulo Freire, particularmente, são uma das mais importantes expressões de um pensamento libertador, comprometido com as transformações sociais. Ao longo dos mais de 500 anos de dominação colonial, na América Latina e no Caribe se construíram práticas epistêmicas de denúncia do colonialismo e da colonialidade, do capitalismo, do racismo, do patriarcado e de outros processos de opressão. Em vários campos do conhecimento, como a filosofia, as ciências sociais, a teologia, a educação, a comunicação e as artes, foram elaboradas formas críticas de pensar o mundo. E como todo pensamento crítico guarda uma dimensão praxiológica que lhe é intrínseca, este pensar crítico têm se dimensionado em movimentos de resistência contra as opressões, e por isso mesmo é combatido pelas elites burguesas, racistas, imperialistas e patriarcais. No Brasil, particularmente, Paulo Freire foi eleito pelo governo de extrema direita de Jair Bolsonaro como “inimigo prioritário” no campo ideológico e educacional.
Em face desta conjuntura, o Conselho de Educação Popular da América Latina e do Caribe (CEAAL), como Movimento de Educação Popular e Movimento de Educadoras e Educadores Populares, por meio de suas entidades filiadas e de outras organizações parceiras, lançou e vem coordenando a Campanha Latino-Americana e Caribenha em Defesa do Legado de Paulo Freire que tem por objetivos: Contrapor-se à ofensiva ideológica contra o pensamento crítico e, em particular, às ideias de Paulo Freire; Defender a importância do seu legado para a educação e outras áreas do conhecimento e para os processos de educação popular desenvolvidos em todo o mundo (em especial na América Latina); Construir processos que contribuam para a produção do conhecimento crítico na educação popular, associando o legado de Paulo Freire aos temas da formação política, da educação popular feminista e antipatriarcal, da economia solidária e outros; Realizar atividades, em diferentes formatos e em diversos países, que deem impulso e publicidade à Campanha e, por último, Articular-se a movimentos sociais e a outros coletivos e redes de resistência para construir a Campanha de forma coletiva e compartilhada.
Defender o legado de Paulo Freire significa também lutar por bandeiras que ele sempre apoiou, como a liberdade de pensamento, a autonomia do sujeito, a democracia plena e o respeito às diversidades. Nesse sentido, o Simpósio aqui apresentado, buscará sensibilizar lideranças de diferentes localidades a abraçarem a Campanha em Defesa do Legado de Paulo Freire, ampliando sua abrangência e potencializando reflexões e ações para além da América Latina.
Palavras chave:
Pensamento crítico, legado de Paulo Freire, resistência contra a opressão.
Referências:
CEAAL. Estrategia de Formación Política del CEAAL. San José-Costa Rica: CEAAL, 2018.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 29ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
FREIRE, Paulo; GADOTTI, Moacir; GUIMARÃES, Sérgio. Pedagogia: diálogo e conflito. 4ed. São Paulo: Cortez, 1995.
FREIRE, Paulo; NOGUEIRA, Adriano. Que fazer: teoria e prática em educação popular. 11ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.
JARA, Oscar. Tres posibilidades de la sistematización: comprensión, aprendizaje y teorización. La Piragua, Santiago, n. 9, p. 129-135, 1994.
MOTA NETO, João Colares da. Por uma Pedagogia Decolonial na América Latina: reflexões em torno do pensamento de Paulo Freire e Orlando Fals Borda. Curitiba: CRV, 2016.
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